Capítulo 3

Primeiro o mais importante

Qualquer coisa aquém de um compromisso consciente com a importância é um compromisso inconsciente com a não-importância.¹
Stephen R. Covey

A importância é algo relativo. O que é importante para mim, pode não ser importante para você, porém, precisamos definir o nível de importância das coisas para que possamos priorizar o que precisa ser feito. Nem tudo que é importante é urgente, mas o que passa a ser urgente, se torna importante, mesmo que em nossa escala de prioridade não seja tão importante assim.

Saber o que se quer para si é o primeiro passo para nos comprometemos com aquilo que é importante na nossa vida. Quando não sabemos o que queremos, outras pessoas saberão e utilizarão isso em benefício próprio.
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Se a importância não está centrada nas suas necessidades, ela será deslocada para necessidades alheias, pois nosso instinto de sobrevivência está sempre em busca de resolver problemas, sejam os nossos ou de outras pessoas. Por isso, saber o que se quer para si e quais problemas queremos resolver nos ajuda a definir o que é mais importante na nossa rotina, principalmente em um mundo em que precisamos tomar milhares de microdecisões no dia a dia.

Foco, prioridade e tempo

Estes três aspectos estão intimamente relacionados quando falamos de produtividade. As pessoas querem ser mais produtivas no seu dia a dia para ganharem mais tempo para si ou para fazerem outras coisas. Como o tempo é escasso e é o mesmo para todos, a única forma de conseguirmos gerenciá-lo é estabelecendo prioridades para o que precisamos fazer e o foco, é um dos recursos que mais pode nos auxiliar neste processo.

Foco

Neste livro, Daniel Goleman, autor de Inteligência Emocional, trata da atenção e seu papel fundamental para o sucesso, demonstrando como, a partir do foco, podemos nos tornar pessoas mais conscientes e atentas às nossas necessidades.²

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Segundo Goleman, para mantermos o foco, precisamos observar as distrações emocionais e sensoriais, que estão a todo momento competindo com a nossa atenção. “Os distratores sensoriais são simples, enquanto lê estas palavras, por exemplo, você está abstraindo as margens em branco ao redor deste texto.” Já os distratores emocionais, podem estar relacionados com pensamentos ou sentimentos que nos arrebatam sem aviso prévio e que podem sequestrar nossa atenção para qualquer coisa que esteja nos incomodando no momento, como uma conta para pagar ou o fim de um relacionamento. Somado a tudo isso ainda temos a ansiedade, uma disfunção emocional que aumenta na medida que interrompemos nosso foco a todo momento para tentar resolver mais de uma questão ao mesmo tempo.

O foco é um aspecto chave quando tratamos da experiência do usuário no uso de interfaces. Além dos distratores sensoriais e emocionais (os quais não possuímos nenhuma gerência), temos também os distratores visuais, que são elementos ao longo da jornada de uso de um produto que podem distrair o usuário da ação que ele precisa realizar.

Uma boa usabilidade deixa o caminho livre para o usuário realizar a sua jornada e não impõe pedágios desnecessários que podem desviá-lo de sua rota.

Precisamos remover distratores visuais da interface de produtos que possam distrair ou confundir os usuários da ação que eles precisam realizar. Botões fora de contexto, excesso de elementos visuais ou até a falta de uma comunicação clara sobre o que precisa ser feito podem não só desviar o foco do usuário como também servir de gatilho para outros distratores sensoriais ou emocionais.

Quando conseguimos reduzir o número de distrações visuais, priorizando a comunicação na direção que o usuário precisa seguir, criamos uma jornada contínua e coerente, que facilita o foco do usuário e reduz o tempo necessário para ele cumprir ações, tornando a usabilidade de qualquer produto efetiva e eficiente.

Efeito von Restorff

Quando vários objetos semelhantes estão presentes, é mais provável que aquele que difere dos demais seja lembrado.

Jon Yablonski

O nosso foco é capturado continuamente por aquilo que nos chama atenção. Segundo Jon Yablonski, autor do livro Leis da Psicologia aplicadas à UX³, cor, forma, tamanho, posição e movimento são fatores que influenciam a todo momento nossa atenção, e por isso, devemos considerar cuidadosamente cada um deles ao criar interfaces.

O contraste, recurso bastante utilizado para realçar estes fatores, é muito eficiente para guiarmos o usuário no uso de um produto, porém, quando utilizado sem critério, destacando vários elementos ao mesmo tempo, pode gerar confusão e distração, sequestrando a atenção do usuário da jornada em questão.

O Efeito von Restorff

Este conceito foi criado em 1933 pela psiquiatra e pediatra alemã Hedwig von Restorff ao descobrir, em um estudo onde empregou o paradigma do isolamento, que os participantes, quando apresentados a uma lista de itens categoricamente semelhantes, lembraram melhor aqueles que eram distintamente diferentes, ou seja, a memória tende a ser aprimorada para itens de um conjunto que são visual ou conceitualmente isolados de outros itens.

A quantidade de informações e o excesso de recursos cada vez mais presente nas interfaces fez com que o usuário comum desenvolvesse estratégias para poder cumprir com suas tarefas, se desviando de distrações e bloqueios no caminho. Uma delas é a atenção seletiva, conceito já estudado há bastante tempo pela psicologia cognitiva, que trata da capacidade de abstrairmos de coisas não relevantes ao nosso redor, para que possamos nos concentrar naquilo que é relevante no momento, e neste sentido que, saber priorizar os elementos visuais que dão pistas ao usuário do que ele precisa fazer, se torna tão importante na usabilidade de um produto.

Outros dois conceitos igualmente importantes são a cegueira a anúncios e a cegueira a mudanças, que são habilidades que desenvolvemos em ignorar toda informação visual que possa parecer com um anúncio publicitário ou que possa trazer algum ruído ou carga de informação que, mesmo sendo importante para o usuário no momento, não esteja bem comunicada. Por isso que, novamente, saber utilizar o contraste e distinguir os elementos visuais entre si se torna tão importante, pois carregar visualmente uma informação pode confundi-la com um anúncio (e ser ignorada) e no outro extremo, trabalhar com grandes volumes de informação sem o devido contraste, pode torná-la igualmente irrelevante para o usuário ao longo de sua jornada.

Quando utilizamos o contraste com bom senso e coerência, diferenciando elementos que são importantes e que dão pistas para o usuário seguir com sua jornada, criamos um caminho seguro e bem sinalizado que facilita a experiência no uso do produto e que contribui para que o produto cumpra com seu objetivo.
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Certezas, suposições e dúvidas

Para definirmos o que é mais importante para o usuário ao projetar uma interface, precisamos conectá-lo com a proposta de valor do produto, e isso passa por mapear as certezas, suposições e possíveis dúvidas que tenhamos em relação ao uso do produto.

As certezas tratam do que já sabemos sobre o problema que está sendo resolvido e dos fatos e evidências que comprovam isso. As suposições nos ajudam a construir cenários hipotéticos de como esses problemas serão resolvidos a partir de recursos e funcionalidades presentes no produto e as dúvidas, tratam de todos os aspectos os quais não temos clareza e que precisam ser comprovados antes de serem considerados.

Uma interface bem projetada ajuda o usuário a manter o foco naquilo que é importante, facilitando a entrega de valor do produto para o usuário.

O mapeamento dessas informações nos ajudam a validar se o produto está entregando valor para o usuário, ou seja, se está ajudando o usuário a identificar os recursos que são mais importantes e que vão conduzi-lo pelo melhor caminho em cada uma das jornadas de uso do produto.

Todo o produto precisa ter uma proposta de valor principal definida, mas cada fluxo (que são as principais ações a serem executadas) também precisa ter uma entrega de valor clara e objetiva, que vai ajudar a orientar a comunicação e todos os recursos e funcionalidades presentes ao longo da jornada.

Por que saber priorizar é tão importante?

Quando priorizamos, assumimos protagonismo da nossa vida, definindo o que precisa ser feito e como. A prioridade coloca ordem e cria um plano de ação que nos ajuda a ter clareza do que precisamos fazer para atingir os objetivos pretendidos. Não priorizar, implica em deixar as coisas e as situações assumirem as rédeas de nossa vida e nos levar por caminhos mais longos e tortuosos para chegar no mesmo lugar.

Quando falamos da interface de um sistema, saber priorizar significa construir fluxos de navegação comprometidos com a entrega de valor do produto
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Para isso, é necessário evidenciar todos os recursos que facilitam a experiência do usuário ao longo da jornada, colocando a proposta de valor sempre como prioridade. Quando a entrega de valor está clara, fica mais fácil priorizar os recursos que atendem às necessidades imediatas do usuário, colocando em segundo plano aqueles que só geram dúvida ou distração.

Para saber priorizar, é preciso ter um conhecimento profundo das dores e problemas que os usuários pretendem resolver para então definir quais recursos serão úteis e como eles devem ser distribuídos ao longo de um fluxo de navegação garantindo que o usuário alcance e perceba a entrega de valor.

Hierarquia e ordem

A função e a forma são dois atributos essenciais quando tratamos da experiência do usuário. De nada adianta ter a função de um recurso definida se não houver uma forma de apresentação apropriada, que indique para o usuário a sua relevância, ou seja, a sua hierarquia e ordem.

Ao priorizar estamos definindo a função, mas para que um determinado recurso seja percebido como relevante para o usuário, precisamos também definir a sua forma de apresentação, a partir da hierarquia e ordem. A função de algo por si só não define a intenção, por isso, para além de priorizar quais recursos são importantes em uma interface, é preciso estabelecer a sua forma e posição, para que eles sejam percebidos adequadamente pelo usuário.

A hierarquia ajuda a estabelecer a ordem e a relação entre os elementos em uma interface, indicando para o usuário o caminho natural para a realização de uma operação.

A hierarquia define o grau de importância e ajuda o usuário a direcionar a sua atenção. Elementos com mais destaque, em posições privilegiadas, indicam ao usuário recursos ou informações importantes para a operação do sistema. Muitos elementos em uma interface, colocados sem critério, podem confundir o usuário e dispersar sua atenção.

Ao definir a hierarquia e ordem dos elementos, facilitamos a experiência do usuário, indicando um caminho natural para a realização de uma operação.
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Quando não há uma hierarquia estabelecida, o usuário utiliza do próprio critério para definir o que é relevante, e como a experiência de cada pessoa é subjetiva, isso pode custar muitas tentativas frustradas até que o usuário encontre o caminho certo. Definir a hierarquia e a ordem dos elementos que compõem uma interface ajuda o usuário a priorizar o que é importante para que ele consiga cumprir com a sua jornada.

Para pensar

O excesso de informações aliado ao tempo escasso faz com que as pessoas tenham que tomar um número cada vez maior de decisões em um espaço de tempo cada vez menor, por isso, devemos saber priorizar o que é importante comunicar na interface de um produto, no momento e local adequados, para não comprometer a experiência do usuário.

Estabelecendo uma hierarquia e ordem na comunicação de uma interface e priorizando aquilo que é relevante em cada etapa da jornada do usuário, o ajudaremos a focar naquilo que é importante, reduzindo atritos, frustrações e aumentando a percepção de valor e sucesso do produto.

Antes de seguir em frente

  1. Você tem conhecimento de quais problemas e dores específicas motivam os usuários a utilizarem seu produto?
  2. A sua interface está orientada a estas demandas? Facilita o acesso aos principais recursos para que o usuário possa cumprir a sua jornada?
  3. Cada fluxo de navegação do seu produto tem uma entrega de valor clara? A comunicação e os recursos ao longo da jornada são comunicados de forma hierárquica e ordenada para facilitar a experiência do usuário?

Referências bibliográficas

¹ COVEY, Stephen R. Primeiro o Mais Importante. Editora Campus, 1995.

² GOLEMAN, Daniel. Foco. Editora Objetiva, 2013.

³ YABLONSKI, Jon. As leis da psicologia aplicadas à UX. Editora O’REILLY. Traduzido por Novatec Editora, 2020.

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Gabriel Oliveira

Especialista em Comunicação Digital, UX/UI e Data Analytics, atua como consultor na EximiaCo ajudando as empresas a utilizarem a tecnologia para gerar mais resultados.

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